Durante 63 anos, grande parte das decisões mais importantes do Brasil foram tomadas no prédio ocupado hoje em dia pelo Museu da República, no Rio de Janeiro. O antigo Palácio do Catete serviu de residência a 18 presidentes brasileiros até a mudança da capital do país para Brasília, em 1960. O edifício ficou marcado pelo suicídio de Getúlio Vargas, em 24 de agosto de 1954.
Eu senti um prazer particular ao percorrer aqueles salões. Porque foi inevitável não lembrar do romance Agosto, que tem como pano de fundo a crise política do governo Vargas e que culminou com a morte do ex-presidente. Li o livro depois de ter visto a minissérie produzida em 1993 pela Globo, a partir da adaptação da obra de Rubem Fonseca.
O bairro do Catete é colado nas Laranjeiras, a nossa base carioca. Nathalia e eu costumávamos ir a pé e andar por ali antes mesmo de o Joaquim nascer. Com ele, passamos a ir ao pedaço que fica no fundo do jardim, voltado para o Aterro do Flamengo, onde há um concorrido parquinho. A criançada mete o pé na areia e se acaba de brincar – leia mais sobre esse espaço no fim do texto.
Como é o Museu da República
O museu tem à esquerda da entrada uma sala com painéis que contam a origem do palácio. Projeto do alemão Gustav Waehneldt, sua construção teve início em 1858 e levou quase uma década para ser concluída.
Batizado primeiramente como Palácio Nova Friburgo, o imóvel com diferentes elementos arquitetônicos pertenceu à família do fazendeiro Antônio Clemente Pinto, o Barão de Nova Friburgo. Ele mandou erguer o edifício a pedido da mulher.
Entediada com a paisagem bucólica da serra, a baronesa desejava viver onde pudesse observar o movimento da rua e das pessoas. E a Rua do Catete era o lugar ideal para admirar a agitação do Rio na segunda metade do século 19 (e até hoje é bem agitada).
O barão e a baronesa morreram três anos depois de o palácio ser concluído. Os filhos é que desfrutaram dele por um pouco mais de tempo. O prédio trocou de proprietário duas vezes (em um delas, quase virou hotel), testemunhou o fim do período imperial e a ascensão da República até ser comprado pela presidência do país em 1896.
O então presidente, Prudente de Moraes, estava doente e afastado do cargo. Coube então ao vice, Manuel Vitorino, adquirir o imóvel e realizar a transferência do poder executivo do Palácio do Itamaraty para o novo endereço, transformando-o no Palácio da República.
Em tempo: Manuel Vitorino era um médico e político baiano, filho de portugueses, mas não é meu parente — embora haja no museu um documento com a letra C na grafia do seu sobrenome, assim como no meu caso.
O que fazer no museu no Catete
Visitar o Museu da República é sentir-se dentro de parte da história do Brasil. Com exceção das notas pessoais acima, todas as informações que você leu até aqui estão expostas em painéis ou em totens dentro das salas do museu. Os textos são resumidos e estão escritos em português e inglês.
Na primeira visita que fizemos em família, Joaquim tinha 7 anos e, como qualquer criança, não estava muito empolgado com o passeio. Contudo, ele ficou parado por incríveis 14 minutos diante de uma TV.
Na tela, um vídeo contava as três etapas da história do palácio: como residência aristocrática, como sede do poder e, atualmente, como museu. Essa trajetória era pontuada por fatos marcantes da vida política, econômica e artística do Brasil.
Nathalia seguiu tirando fotos enquanto assistíamos ao vídeo. Ela chegou no fim da exibição, e Joaquim disparou: “Mamãe, sabia que tudo aqui veio de vários países? A escada e os vidros do teto vieram da Alemanha! As pinturas, da Grécia. Os lustres são da França!”
Tudo bem, ele aumentou um pouco e botou no mobiliário peça vinda até do Japão. O que não seria impossível, pois praticamente todo o material usado na construção foi trazido do exterior.
No site oficial do Museu da República é possível realizar uma Visita Virtual, que serve como recurso como um guia áudio (ah, não se esqueça de usar o fone de ouvido para não atrapalhar outros visitantes).
E não deixe de olhar para baixo e para cima durante a visita, para não perder a pintura (teto) ou o mosaico (piso) e a riqueza de detalhes da decoração. Não use flash nas fotos. É proibido, e os funcionários do museu marcam em cima de quem burla a regra (com toda razão).
O acervo do Museu da República é formado por cerca de 9 mil peças, entre objetos e coleções pessoais dos presidentes que dali comandaram o Brasil. No salão ministerial, repousa sobre a imensa e pesada mesa de madeira o conjunto de pastas de couro usadas em despachos e reuniões entre os líderes de cada área. É nesse espaço que está também o quadro A Pátria, tela em óleo pintada por Pedro Bruno, em 1919, representação simbólica dos primeiros anos da República.
As marcas republicanas estão presentes também na sala de refeições, onde a prataria, as taças, os pratos e os guardanapos levam a inscrição Palácio do Catete. A mesa está posta; os janelões altos, abertos com vista para o Jardim do Palácio.
O 3º andar do Museu da República era onde ficavam os quartos dos moradores do palácio. O dormitório que foi do ex-presidente Getúlio Vargas durante sua segunda passagem pelo poder (1951-1954). Por razões óbvias, é o espaço mais simbólico do palácio.
Os móveis são de 1920, encomendados na época por causa da visita dos reis da Bélgica ao Brasil. A decoração é até um tanto espartana. O banheiro da suíte é todo de louça branca e impressiona pela simplicidade quando comparado à riqueza das demais salas do palácio.
O pijama de Vargas já não fica mais sobre a cama. Uma caixa de vidro guarda a peça de roupa que o ex-presidente usava na noite de sua morte. Com ele estão a bala e o revólver de cabo branco de madrepérola, cujo tiro mudou a história em 24 de agosto de 1954.
Quando estivemos no Museu de República pela última vez, apenas um quadro com um desenho marcava o lugar da roupa. A peça histórica ficaria seis meses lá e o restante do tempo meses fora, para receber cuidados de conservação, segundo informaram os funcionários do museu.
Apesar de ter sido palco de uma tragédia, o quarto não chega a ter uma aura pesada. Contudo, Juscelino Kubitschek não pensava assim. Eleito em 1956, o presidente preferiu morar no Palácio Laranjeiras — localizado no alto do Parque Guinle — a viver no Catete. No mesmo ano em que a capital do país foi transferida para Brasília, o palácio passou a abrigar o Museu da República.
VALE SABER
Endereço: Rua do Catete, 153, Catete
Transporte: A estação Catete do metrô tem uma saída bem em frente ao museu. Há diversos ônibus vindos da zona sul que passam na Rua do Catete e das zonas norte e Niterói que deixam o visitante na Rua Bento Lisboa. Como há muitas obras no Rio, algumas linhas sofreram modificação. Consulte o vadeonibus.com.br (site da Federação das Empresas de Transporte de Passageiros do Rio de Janeiro)
Funcionamento: De terça a sexta, das 10 às 17 horas. Sábados, domingos e feriados, das 11 às 17 horas — os portões são sempre fechados 30 minutos antes do fim das visitas.
O jardim do palácio funciona diariamente, das 8 às 18 horas, com entrada gratuita; desde maio de 2022, o parquinho tem novos brinquedos, todos gratuitos
Preço: Grátis (temporariamente)
Alimentação: Piqueniques são permitidos no jardim do Palácio do Catete, limitado a grupos de 10 pessoas